Ensinar para Saber. Educar para Ser.

Educar é preparar para a vida mas é também, em si, a própria vida: dos pais (porque é a sua missão), dos professores (porque é a sua profissão), mas sobretudo das crianças, porque é nesta fase das suas vidas que constroem sonhos e referenciais.

O binómio Saber/Ser foi o ponto de partida para a preparação e para a realização do I Congresso. Escola, Família e Sociedade que se realizou no dia 12 de novembro, num esforço conjunto da Federação de Associações de Pais de Vila Nova de Gaia (FEDAPAGAIA).

Enquanto pai de dois filhos, um rapaz de 12 anos e uma menina 8, preocupo-me em perceber e em refletir sobre diversas questões da Educação que estão na ordem do dia: A Escola deve ser apenas transmissora do “saber” ou contribuir para “ser”? Como deverá ser trabalhada a percentagem dos 25% de flexibilidade de autonomia curricular? Num novo contexto de descentralização de competências, com maior protagonismo das Escolas ou dos Municípios, estará a comunidade educativa mobilizada e preparada para o papel mais interventivo que lhe é pedido? Considerando as horas que as crianças estão atualmente na escola, os TPC mecanizados, são necessários? Será que a pressão imposta pelos exames, pelos rankings, está a fazer com que as Escolas percam o lado da formação dos alunos enquanto seres humanos?

Foi sobre estas e sobre muitas outras questões que os ilustres convidados do I Congresso Escola, Família e Sociedade se debruçaram, com muito interesse inerente para os participantes. O Dr. Eduardo Sá foi um dos oradores que nos deu várias notas sobre estes três players, começando por nos alertar para o facto de precisarmos de ser pais durante mais tempo: “não chegam os dez minutos de amor que damos à  noite aos nossos filhos, quando contamos uma história e lhes damos um beijinho de boa noite”. Um feito difícil quando os pais trabalham
tantas horas por dia e ainda querem, imagine-se, ser interventivos na comunidade educativa! Relativamente à Escola, se for uma “linha de montagem de jovens tecnocratas de sucesso estraga as crianças”, não raras vezes erradamente diagnosticadas e medicadas para a hiperatividade.

A Escola deve antes constituir um elo de ligação entre o mundo e a família, entre o estudo e a experiência, entre o brincar e o aprender. A pressão sobre as crianças é muito grande, as exigências ao nível da atenção não são proporcionais aos tempos de brincadeira que as crianças deveriam ter, com aulas tão longas e intervalos tão curtos. “Brincar é pelo menos tão importante como aprender!”

Educar é obra de todos Sobre a estagnação do sistema de ensino, Rui Teixeira, de 17 anos, em representação do Movimento Associativo Estudantil lançou algumas questões que também a mim me preocupam: por que são todos os alunos avaliados da mesma forma se são todos diferentes? Por que não se incentiva o trabalho em grupo? Por que se trabalha três anos em função (da pressão) dos exames nacionais? É necessário que as aulas sejam tão longas? Como se quer jovens interventivos quando há falta de representatividade dos alunos nos conselhos dos órgãos decisivos?

Os professores dizem, muitas vezes, que estão limitados no que toca à capacidade de alterar as rotinas, mas o Professor Adelino Calado, diretor da Escola de Carcavelos, mostrou-nos que é possível marcar a diferença, criando novos desafios tanto aos alunos como à Comunidade Educativa. A título de exemplo, na sua escola, não há retenções no Básico; não há toques de campainha; não há substituições (mas um incentivo aos alunos a ficarem na sala a trabalhar); não há TPC sistemáticos; há assembleias de alunos; nos primeiros 15 dias de aulas não há manuais, é o chamado “período de namoro”, em que professores e alunos empenham o tempo para se conhecerem; os professores assistem às aulas uns dos outros para aprenderem novas metodologias; o livro de ponto é escrito pelos alunos; o erro é valorizado, para que possa ser analisado e investigada a solução.

Em Portugal, além de não termos esta visão positiva do erro (em contexto próprio, bem entendido), temos uma fraca prática de partilha
de boas experiências e as escolas, por vezes, não fazem diferente, porque não sabem como fazer. Felizmente, vamos tendo acesso a estes bons exemplos que nos fazem refletir sobre os caminhos que podem ser trilhados para termos crianças mais felizes, além de muito amadas. Este é um ponto importante que quero salientar: de nada nos vale termos um sistema educativo perfeito se as crianças não tiverem o necessário acompanhamento por parte dos pais, como já foi referido. Na família deve estar a base, na escola a ligação entre o ser e o saber, na Sociedade o acolhimento.

De salientar ainda que, como referia o Secretário de Estado da Educação, “é a paixão pelos filhos que nos move” e os problemas na educação que encontramos em Portugal são comuns a muitos outros países. João Costa recordou que é preciso pensar a inclusão como um fator de avaliação, repensar a estrutura curricular, emagrecendo-a, e procurar mais perguntar do que responder, num regresso à metodologia do pré-escolar e obedecendo à urgência de educar para a cidadania.

Em Vila Nova de Gaia, há mais de 100 associações, pelo que o caminho é árduo e é preciso monitorizar as diversas necessidades. Em simultâneo, é importante perceber o que motiva os nossos jovens, o que interessa aos nossos alunos, para que possamos também trabalhar em conjunto com as suas preocupações e aspirações, colocando-nos no seu lugar e dando-lhes voz.

Como dizia a Dra. Paula Fernandes, presidente da CPCJ Gaia Norte – “a Educação da criança é obra de toda a comunidade” -, ou ainda o apresentador Jorge Gabriel – “temos todos de arregaçar as mangas da vontade”. Acredito que uma Comunidade Educativa esclarecida e interventiva faz a diferença na construção de uma Escola Pública de qualidade, uma Escola com Alunos felizes, saudáveis e capazes de cultivar os terrenos mais difíceis de trabalhar: os da inteligência e os da emoção. Este é um dos princípios que nos moveu na  organização do I Congresso Escola. Família e Sociedade que esperamos tenha continuidade, encorajando-nos a manter a dedicação para
investir o (pouco) tempo (extra) de que dispomos para Educar para Ser. Ensinar para Saber.

Artigo de opinião:
Author: Carlos Goncalves – presidente da FEDAPAGAIA

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